segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O poder decisório das Autoridades judiciais e a produção normativa- Parte 1

 PARTE 1- O PROCESSO DE APLICAÇÃO DO DIREITO: INTERPRETAÇÃO, DECISÃO E ARGUMENTAÇÃO.

PROF. ANGEL RAFAEL MARIÑO
PROF. GILBERTO FACHETTI (sistematização, revisão, ordenação)

SUMÁRIO: Introdução; 1. Interpretação; 2. Aplicação do Direito; 3. Argumentação; 4. Desenvolvimento judicial do Direito; 5. Conclusão;  Referências bibliográficas.
RESUMO: A partir da trilogia interpretação – aplicação- argumentação, defende que a aplicação do Direito é a utilização da interpretação dada a uma norma jurídica para a resolução de um problema jurídico, de maneira que a decisão é sempre resultado de uma prévia interpretação. Analisa, dessa maneira, o processo como meio de subsunção, interpretação, realização do Direito e argumentação. Defende, ainda, que a aplicação do Direito não é atividade restrita aos juízes, expondo as situações em que também o legislador e a Administração Pública atuam aplicando normas. Por fim, aponta a necessidade de argumentação e das decisões tomadas nesse ato de aplicação do Direito. 
PALAVRAS-CHAVES: Interpretação – processo – aplicação – círculo hermenêutico – dialética estimativa – decisão judicial- poder dos juizes- argumentação.


INTRODUÇÃO.
Toda aplicação supõe, obrigatoriamente, uma interpretação. Mas nem toda interpretação supõe uma aplicação. Nos tempos de Napoleão acreditava-se que a norma poderia ser aplicada sem ser interpretada. É justamente a idéia contrária que será defendida nesse trabalho, afinal, como chegar a uma decisão, ou seja, como realizar uma norma, sem previamente descobrir do que está se tratando, a mensagem que ela contém, ou seja, seu significado? Para chegar a uma decisão, no processo de aplicação, deve-se primeiro descobrir uma decisão anterior que está contida nessa norma. E para determinar o que está contido nessa norma que será adotada ou utilizada, é necessário, preliminarmente, desvendar o que ela diz, qual o dever-ser, a conduta planejada, a regra, o mandato, o que está requerido. Veja, portanto, que a decisão decorre de um processo complexo, baseado na trilogia linguagem – interpretação – aplicação.
A aplicação é sempre uma escolha. Autorizar ou não autorizar. Em nossas vidas, todos os nossos atos são sempre escolha e decisão. Geralmente essas decisões têm fundamento em uma norma. A aplicação do Direito é uma decisão que tem como fundamento, uma norma. Por isso, talvez o Direito seja um sistema de decisões.
Doravante, aplicação, interpretação e linguagem serão associadas num processo único, esclarecendo que o momento de aplicação supõe sempre uma realização, seja de um tipo de norma, seja de outro, e que essa aplicação sempre supõe uma decisão, a partir de uma escolha, que se dá a partir da interpretação, um processo prévio que tem a função de atribuir significado aos enunciados jurídicos.
Com isso, será demonstrado que não a realização do Direito não é um processo simples; é um processo simples para aqueles que vêem a aplicação silogisticamente, ou um simples silogismo. Quem admite a aplicação como um processo de altíssima complexidade, terá que compreender sua complexidade e suas dificuldades; terá que concordar com Dworkin – Levando os direitos a sério – quando reforça que a atividade de aplicação que o juiz faz sofre influência de muitos fatores que não são somente jurídicos.
     INTERPRETAÇÃO.

A interpretação é uma atividade cuja realização nem sempre foi admitida, como sempre foi a aplicação. Por isso, embora estejam relacionadas, não se confundem, apesar de serem conseqüências obrigatórias da questão da linguagem do Direito.[1]
A atividade de interpretação é imprescindível para a utilização da aplicação e para o entendimento, a compreensão, a explicação e a descrição do Direito. Sem atividade interpretativa, não é possível entender o Direito. Isso porque o Direito é muito mais do que a vontade do legislador, ou apenas o que está no texto da norma. O uso dos pronomes, o uso dos tempos verbais, das preposições, dos substantivos, tudo isso muda o significado de um enunciado. Da mesma maneira que a função social do enunciado, a pragmática demonstra que o mesmo enunciado adquire diferentes sentidos, dependendo da função social que ela tem e da agente que emite o enunciado. As mesmas palavras, o mesmo significado, pela função do enunciado, faz mudar a proposta, o objetivo, aquilo que está sendo procurado.
É mais importante interpretar o Direito do que aplicá-lo. É possível, por exemplo, interpretar uma norma constitucional sem nenhuma pretensão de aplicá-la. Agora é difícil que um aplicador possa fazê-lo sem antes interpretar. O juiz necessita desentranhar os significados das normas para determinar qual aquela que melhor se aplica ao caso. Trata-se de uma subsunção elaborada, pois um fato pode ser subsumível em a mais de um suposto fático.
Carrió demonstrou que a linguagem jurídica tem como base a linguagem natural, portanto, os mesmos problemas de ambigüidade e de vagueza que têm as palavras na linguagem natural são levados para o Direito. Mas a linguagem jurídica possui limites: 1) o contexto em que estejam as palavras; e 2) a situação em que são utilizadas ou emitidas.
A interpretação é atividade pela qual se determina o sentido e alcance dos enunciados jurídicos. Essa atividade, essencial e básica para o Direito e os juristas, tem como seu fundamento a ambigüidade, vagueza e textura aberta dos enunciados jurídicos e da linguagem jurídica. Recorre-se à linguagem para criar, promulgar e publicar os textos jurídicos. A interpretação implica sempre valoração, daí seu reconhecido caráter  polêmico e dialético. Várias interpretações surgem sobre o mesmo texto: qual é a melhor e a certa? (a racionalidade argumentativa)
Utiliza-se para referir duas coisas:
       1. a atividade dos operadores do Direito no seu cotidiano profissional de utilização e aplicação do sistema normativo; (Nino, Reale)
       2. a atividade que realizam os teóricos do Direito. Nessa última acessão significa o Método do Direito.  (Savigny, Larenz, Ross)

n       ETAPAS HISTÓRICAS
1. A interpretação dos textos legais e a solução dos casos. O Direito romano Ius Publici Respondendi
2. A leitura dos textos antigos: Os Glosadores e os Pós-glosadores.
3. A negação da necessidade e importância da interpretação e a dogmatização do pensamento jurídico. A codificação.
4. As críticas ao dogmatismo: Escola livre do Direito e a Escola da livre investigação científica.
5. A interpretação depois de Savigny. Os métodos de interpretação.
6. Linguagem e interpretação: a visão pós- moderna. Carrió e outros

Desde a decadência do Império Romano, Justiniano ordenou uma recopilação de todo o Direito que existiu em Roma, vigente desde a época clássica (República Romana). Deveria ser feito um corpo de normas contento todas aquelas formulações, o que definitivamente ocorreu, tendo o pretendido corpo sido formulado e de Corpus Juris Civilis. Mas se temos em conta o que aconteceu, ou seja, que se partiu inclusive das opiniões dos clássicos da época de ouro do Direito romano, isso que se fez foi, na verdade, um movimento interpretativo que reuniu também as respostas que os jurisconsultos davam às consultas que eram feitas a eles sobre o Direito positivo.
 Nos séculos XII e XIII surge o movimento dos glosadores e dos pós-glosadores, que foi uma reação a uma fase em que o Direito estava numa franca decadência se comparado com o Direito clássico romano. Os glosadores estavam autorizados a fazer comentários (glosa) junto aos textos compilados. Surgem, assim, as glosas sobre o Corpus Juris Civilis. Já os pós-glosadores tiveram a função de fazer comentários sobre as glosas. Observe, no entanto, que não é possível fazer comentários se não mediante uma função interpretativa, embora fosse uma interpretação limitada ao texto legal: eles deveriam interpretar a partir do que estava literalmente escrito.
O movimento codificador do século XIX, que teve como resultado o racionalismo, acabou entendendo que a lei é o resultado da razão do homem. Tudo que era produzido pela razão era perfeito. Depois que a razão chegou à lei, nada mais havia a ser feito, ou seja, desnecessária qualquer interpretação, já que era tudo perfeitamente produzido pela razão culminante do homem.[2]
Posteriormente, o positivismo jurídico acabou assumindo também a necessidade de limitar toda atividade interpretativa, abrindo espaço a dois tipos de interpretação: 1) uma interpretação que procura unicamente a vontade do legislador (interpretação subjetiva); ou 2) uma procura da vontade da lei (interpretação objetiva). Uma vez criada a lei esta se tornava independente do seu criador, e o intérprete deveria somente buscar sempre no Direito positivo a mensagem, sempre tendo como referência a vontade do legislador ou a vontade da lei, mas nunca poderia ir além do Direito positivo.[3]
Nino diz que a interpretação como atividade tem duas etapas: 1ª) uma etapa pré-interpretativa, que se dedica a identificar uma atividade prévia que o intérprete deve realizar no momento da determinação do significado, ou seja, previamente à determinação do significado, o intérprete deverá identificar se existe no sistema alguma norma ou quantas normas sobre aquela determinada questão. Antes de entrar na questão sintática, semântica, pragmática, lógica, primeiro tem que identificar o enunciado, a norma de importância e de transcendência para a interpretação da norma. Concluída essa etapa, passa-se a outra; e 2ª) a outra etapa interpretativa trabalha com o significado dos enunciados encontrados. Aqui cabe uma subdivisão: um primeiro momento, em que devem ser procurados os diferentes significados que uma oração ou um enunciado ou uma proposição tem (o caso pode ser diferente, os fatos podem ser os mesmos, mas as pessoas podem ser diferentes); e um segundo momento que corresponde à escolha de um significado dentre todos os possíveis que o intérprete formulou.[4],[5]
       
 OS PROBLEMAS DA INTERPRETAÇÃO
1. Sintáticos (a construção do enunciado, a conexão das palavras )
2. Semânticos (o significado das palavras e em especial das frases. O  significado do enunciado como um todo)
3. Lógicos (as antinomias entre enunciados do sistema; as redundâncias e as pressuposições)
4. Pragmáticos (Vid. Ross.)
ETAPAS DA INTERPRETAÇÃO
1. Pré- interpretativa.
          a) determinar se existe uma norma (no sentido de enunciado lingüístico)  aplicável ao caso;
          b) verificar se existe um “precedente vinculante”;
          c) determinar a aplicabilidade ou não do enunciado normativo ao caso.
2.  Interpretativa
        a) determinar os diferentes significados que o enunciado tem em relação ao caso;
        b) determinar as conseqüências jurídico- normativas dos diferentes significados do enunciado para o caso e os sujeitos implicados;
        c) relacionar as conseqüências jurídico- normativas com outras e outros fatores;
        d) decidir por um significado, que é tomar uma decisão. 
3. Pós- interpretativa (de justificação) (Vid. Dworkin; Nino)

 Classificação da interpretação.
 A interpretação pode ser classificada de acordo com a fonte, o intérprete, o alcance e o método. Tendo em vista as peculiaridades deste último em relação à aplicação do Direito, interessante tratá-lo em tópico independente e específico. 
A classificação segundo a fonte depende da origem do significado da norma. Pode ser subdividida em interpretação objetiva e interpretação subjetiva. Nesses dois tipos de interpretação está uma grande polêmica da história. Relaciona-se com aquilo que deve procurar o intérprete: se a vontade do legislador, ou seja, sua intenção no momento de criação da norma, a vontade da autoridade que emitiu a norma (interpretação subjetiva); ou se supõe que não se deve procurar a vontade do legislador e, sim, a vontade da norma, quer dizer, se é verdade que a norma foi criada por certo legislador, em determinado momento ela se separa deste (promulgação) e acaba tendo vida própria, devendo o intérprete procurar a intenção que está na norma, isto é, sua razão teleológica. .
O critério de classificação segundo o intérprete, tradicionalmente, dividiu a interpretação em autêntica, judicial e doutrinária:
·       Autêntica ou legislativa é aquela feita pelo próprio legislador, ou seja, quem criou a norma é a pessoa mais indicada para dizer o que ele quis dizer no momento em que a criou;
·       Judicial é a realizada pelo Poder Judiciário, especificamente pelos juízes; e
·       Doutrinária é a feita pelos teóricos do Direito.
Essa subdivisão não está completa porque não leva em consideração outros sujeitos que também fazem interpretações e que, no entanto, não são nem doutrinadores, nem juízes e nem legisladores. São os sujeitos normativos, cidadãos comuns, destinatários das normas, que necessitam ter consciência do que está proibido e do que está permitido, porque estas normas planejam e prevêem seu comportamento. E existem também outros aplicadores, a exemplo da Administração Pública, que é tão importante quanto os juízes; a Administração Pública é entidade aplicadora do Direito por excelência, tal qual o Judiciário.[6]
Por fim, a classificação segundo o alcance divide a interpretação em declarativa, extensiva e restritiva. A declarativa lida com o texto, ou seja, determina o significado no estrito marco do que está dito na estrutura lingüística, quer dizer, é uma interpretação cujo pressuposto é aquilo que está declarado no enunciado, na norma, na proposição. Já a extensiva vai além do que está declarado no texto da norma, e acaba influindo mais no significado da estrutura lingüística, pois o intérprete entende que o legislador diz menos do que deveria e, então, vai além, estendendo o significado da norma. A restritiva ocorre quando o intérprete entende que o legislador, nessa estrutura lingüística, disse mais do que deveria e, dessa forma, ele restringe o alcance do significado da norma. Aqui limita o significado.

 Métodos e critérios de interpretação.
Os critérios e métodos de interpretação incidem na interpretação do Direito. Os autores geralmente são excludentes, ou seja, ou se interpreta por um método ou por outro. Todavia não é bem assim, a exemplo do que ocorre com as interpretações objetiva e subjetiva, em que o ideal é trabalhar com as duas. Dessa maneira, o melhor método é aquele que, na verdade, faça uma junção de todos os métodos no processo de interpretação. Isto fará com que a interpretação seja uma interconexão.
Porém, já que é preciso utilizar vários métodos, então é preciso também ter determinados critérios de interpretação. É preciso, preliminarmente, determinar critérios para realizar a interpretação, pois esta não pode ser resultado da livre e espontânea intenção do intérprete. Tais critérios guiarão o trabalho do intérprete, e são o que alguns chamam de critérios de interpretação e outros chamam métodos de interpretação.[7]
Não se trata de diferentes métodos de interpretação entre os quais o intérprete venha porventura escolher um, segundo seu arbítrio, mas de pontos de vista diretivos aos que cabe peso distinto. Quando o intérprete aplica diferentes pontos de vista com pesos distintos, entende-se que é porque está num processo de complementação. A justiça da solução é uma meta desejável da atividade judicial: a justiça não é a utilização de um método, senão o resultado que se espera após a interpretação.
A primeira referência a essa questão da interpretação foi colocada por Savigny, no século XIX, que defendia o Direito como expressão do “espírito do povo”. Savigny já tinha formulado critérios de interpretação, quais sejam: gramatical, lógico, histórico e sistemático.
O entendimento gramatical procura seu significado através da estrutura lingüística, ou seja, quais os sentidos que tem as palavras, como elas estão conectadas, qual a relação lingüística que se dá entre elas, uma vez que, conectadas no sentido da linguagem, contêm um determinado significado. Procura-se o significado da norma ou do enunciado a partir da estrutura gramatical do enunciado, os sentidos da palavra e de que forma estão conectadas.
O critério lógico também foi desenvolvido por Savigny no sentido de que a interpretação tem que evitar incoerências. Com a interpretação lógica procura-se determinadas incoerências na busca do significado, portanto, quando se pretende evitar contradições no processo lógico, absurdos interpretativos, é preciso utilizar certo rigor lógico.
O método histórico refere-se à busca do significado das normas não a partir de métodos lógicos ou gramaticais, mas sim à procura do momento da criação da norma, o fundamento histórico para a criação da norma, ou seja, buscar no legislador, buscar quais eram as discussões no processo preparativo, qual era a situação, qual era o pensamento, quais os critérios sociais, a demanda social, o que o motivou, a maneira como foi regulada.
Outro método de Savigny é o critério sistemático, no qual ele defende que o Direito é um sistema e, portanto, as normas que nele aparecem devem preservar uma determinada unidade, por isso, no processo de interpretação deve-se preservar a unidade para que não ocorra quebra da sistemática do Direito. Considera que a norma pertence a um sistema e, portanto, o significado que ela tem não pode ser visto de maneira diferente, dissociada do significado que ela tem em relação ao Direito ao qual ela pertence.
Também Larenz tratou de elaborar critérios de interpretação, que, no entanto, diferenciam-se daqueles de Savigny, o que não significa dizer que não derivam destes. São critérios que podem ser entendidos como conseqüência aos critérios de Savigny: sentido literal, contexto significativo da lei, intenção reguladora, critérios teleológico-objetivos, conformidade com a Constituição e inter-relação dos critérios de interpretação.
O primeiro é o sentido literal, e deste ninguém pode se afastar. Significa interpretar dentro do significado da palavra, ou seja, do significado da norma.
O contexto significativo da lei refere-se a identificar que essa norma que está sendo interpretada pertence a uma lei, o significado dela nunca poderá ser achado fora do contexto em que ela está colocada. Procura o significado da norma no contexto significativo da lei, no marco contextual em que ela se encontra.
A intenção reguladora, isto é, fins e idéias normativas do legislador histórico, pode ser associada ao método histórico de Savigny em que, para decidir qual o significado que a norma interpretada tem, busca-se as intenções do legislador. Aliás, mais do que as intenções, o contexto histórico em que se deu a formulação ou a criação da norma.
Nos critérios teleológico-objetivos não se procura as intenções do legislador no momento da criação, mas sim o significado que a norma tem hoje, qual a sua finalidade no presente.
E, ainda, a conformidade com a Constituição, pela qual toda interpretação deve partir da busca do significado em conformidade com a Constituição.
Agora, o mais importante é evitar o isolamento desses critérios, devendo-se buscar uma inter-relação entre esses diferentes critérios de interpretação. O papel do intérprete é exatamente relacionar um critério interpretativo aos demais.
Já Ferraz Júnior faz a seguinte classificação: diz que os chamados métodos de interpretação são na verdade regras técnicas que visam à obtenção de um resultado. Como elas procuram ser orientações para os problemas de conflitos, esses problemas são de ordem semântica, sintática e pragmática. Essas regras técnicas são: 1) interpretação gramatical, lógica e sistemática; 2) interpretação histórica, sociológica e evolutiva (ou seja, quais são as necessidades sociais que hoje existem e como deve ser lida essa norma para corresponder à realidade social); e 3) interpretação teleológica e axiológica (busca da finalidade da norma, de sorte que há determinados critérios éticos, do que é justo, porque a justiça não é um critério interpretativo, senão o resultado que se busca com a interpretação). Expõe, também, que essas regras técnicas não são métodos, mas orientações diretivas.
Outro método discutido é o de Dworkin, em que ele defende, embora não claramente, o método construtivo, ou seja, a interpretação do Direito como um processo de construção do Direito. O resultado não está na lei, na norma, mas na construção do significado, partindo como pressuposto daquilo que o juiz entende como sendo o significado da norma. Porém, essa construção não depende apenas do juiz, pois, ao mesmo tempo, é também o que a sociedade demanda que seja estabelecido. Veja que há uma junção dos metidos gramatical e sociológico com o histórico e evolutivo.[8]
Observe que esses diferentes posicionamentos não oferecem critérios contraditórios. Pelo contrário. Eles fazem sentido a partir da consideração de que existem simultaneamente, e que estão entrelaçados, de maneira que ao intérprete cabe a tarefa de considerá-los todos concomitantemente.


2. APLICAÇÃO DO DIREITO.

Aplicação é a utilização de preceitos normativos – normas – para solucionar casos concretos, quer sejam conflitos ou não. Esse processo aplicativo sempre supõe uma decisão.
A importância deste tema está no fato de que o Direito se realiza através da aplicação, e todos os trabalhos dos operadores do Direito giram em torno, justamente, da aplicação. Porém, se por uma parte é verdade que a aplicação do Direito é a atividade principal em torno ao Direito, é uma falácia dizer que o Direito depende da aplicação.[9],[10]
Preliminarmente, é preciso estabelecer duas importantes questões para a caracterização da aplicação do Direito:
1.   Todo processo de aplicação é um processo de realização das normas, seja a realização de normas primárias ou de normas de conduta, ou realização de normas secundárias ou de normas de organização, ou, ainda, de normas que conferem competência. A realização compreende em procurar na sociedade o sentido teleológico da norma, pelo qual ela deve ser efetivamente cumprida;
2.   Todo processo de aplicação do Direito é sempre um processo decisório, do que se infere que todo o Direito e toda norma é um processo decisório. As normas representam uma decisão daquele que tinha competência para tomá-la. A decisão é o resultado da aplicação da norma, portanto, toda aplicação supõe uma decisão.
Tradicionalmente a aplicação é estudada como silogismo entre a premissa maior (norma) e a premissa menor (fato). Porém, este processo oferece uma visão estreita da aplicação.
Por isso, é melhor seguir a lição de Dworkin, que permite uma visão mais ampla, um entendimento amplo, que bem demonstra que a aplicação do Direito não é um processo simples como desenhado até então. Defende Dworkin que nesse processo de aplicação, entre a norma – como premissa maior –, e o fato – como premissa menor –, existem diversos outros fatores – de ordem política, ideológica, moral, circunstancial, espacial e temporal – que tornam o processo de aplicação bastante complexo.[11]
Estas razões fazem com o processo não seja tão simples. Não é possível minimizar a importância que tem a aplicação como processo decisório, como processo de realização do Direito, como processo subseqüente da interpretação. Por isso é tão importante.
A complexidade do processo de aplicação está no fato de que ele supõe uma dupla leitura da norma (premissa maior): 1) parte de uma leitura descritiva; e 2) passa a uma leitura da parte prescritiva.
Quando um juiz decide, ele utiliza dois tipos de normas: a norma que autoriza a decidir (normas de competência) e a norma que se ajustará ao caso concreto. Sempre o processo de aplicação supõe por uma parte a decisão, e por outra parte a realização. Dessa maneira, a aplicação compreende o binômio decisão – realização.[12] A aplicação é um processo especial de realização porque nele participa o Estado, buscando que o sentido teleológico seja executado.[13]
Peces-Barba, Fernandez e Assis (Curso de Teoria del Derecho) tratam a  aplicação como aquela atividade consistente na utilização de uma norma para a resolução de um problema jurídico. Nesse sentido sua relação com a interpretação é clara, já que a norma, para ser utilizada, deverá ser previamente interpretada. Assim, num sentido mais correto, é possível dizer que a aplicação é a utilização da interpretação dada a uma norma jurídica para a resolução de um problema jurídico.  Isso põe por terra qualquer lição no sentido de afastar a aplicação como utilização dada a uma interpretação, ou seja, essa ligação entre interpretação e aplicação não está mais em pauta de discussão. Isso porque interpretação significa busca do significado, no sentido de alcance. Uma vez que o aplicador chega a um determinado significado, segue o momento da decisão, ou seja, sempre a decisão supõe previamente a interpretação da norma. A decisão é resultado de uma prévia interpretação. Com isso, há um distanciamento dos jusrealistas.

 Aplicação e subsunção.

A aplicação é um processo pelo qual um fato subsume-se em uma norma. Ressalte-se, porém, que essa a atividade de aplicação é aquela na qual intervém o Estado e, por isso, ao tratar do tema não se pode afastar o tratamento da questão dos órgãos e instituições com competência para aplicar o Direito.[14] O que mais importa, doravante, é a aplicação realizada pelas instituições e órgãos do Estado, porque é o mesmo criador ocupando-se dos objetivos a sua criação, ou seja, a preocupação do Estado em atingir a finalidade que  ele mesmo deu à norma no momento em que a produziu.[15]
Mas o que tipicamente é um processo de produção de normas é, na verdade, um processo resultante da aplicação de normas, quando o aplicador é instituição ou órgão do Estado.[16],[17]
Quando as instituições ou órgãos aplicam o Direito duas características se impõem: 1ª) a subsunção resulta da atividade de um fato a ser subsumido em uma norma geral, em que é produzida uma norma particular; e 2ª) a norma produzida é hierarquicamente inferior à norma aplicada.
Se realizado pelo Poder Executivo, não é diferente. O P. Executivo também cria normas gerais que podem ser através de ministros ou o presidente através de um decreto presidencial, e normas particulares, especialmente pelas manifestações da Administração Pública. Só que essas normas produzidas também são hierarquicamente inferiores à norma que foi aplicada e que deu origem a essa norma nova ou derivada ou deduzida dessa norma geradora.
Esse processo pode ser assim esquematizado: PREMISSA MAIOR (norma geral) + PREMISSA MENOR (fato) = CONCLUSÃO (uma nova norma).[18]
Subsumido o fato à norma – a premissa menor na premissa maior, ou seja, verificado e comprovado que este fato estava descrito na norma –, surge uma determinada proibição (que é a prescrição que a norma tem), que também traz, na parte prescritiva da norma, uma conseqüência, a sanção. A conclusão, então, de que o indivíduo deve ser preso é, primeiramente, uma norma jurídica particular, e, segundo, essa norma é uma conclusão originada do resultado de que essa premissa menor foi subsumida em uma premissa maior, por exemplo, do Código Penal. Só que esta proibição de matar o outro supõe uma condenação que está prevista na prescrição, e a conclusão não é a sanção (porque faz parte da premissa maior); a conclusão é a sentença. Não é possível aplicar a premissa maior se o fato não for subsumido (se não encaixar na descrição da norma).
É preciso esclarecer que essa subsunção não pode ser tratada como um simples silogismo, senão, sempre perante um fato, isto é, perante as mesmas premissas maior e menor, haveria sempre a mesma conclusão. Mas as conclusões nem sempre são as mesmas. Pode ocorrer que do mesmo fato, da mesma norma, decorram conclusões variadas, porque nessa atividade de subsunção, outros fatores intervêm fazendo com que o silogismo seja quebrado, imperfeito. Porque existem outras circunstâncias de diversas naturezas, como já disse Dworkin, aqui citado anteriormente, que intervêm no processo de aplicação, como os valores morais e políticos, os princípios e preconceitos etc.
Há, no entanto, um elemento mais objetivo que intervém nesse processo de subsunção, que é o elemento prova. Na subsunção o aplicador necessita levar em conta determinadas provas que permitem verificar se o fato realmente aconteceu da maneira que está descrito na premissa maior, comprovar se os envolvidos no fato são os sujeitos descritos na premissa maior, e se, verdadeiramente, a ação dos sujeitos que intervêm neste fato são atividades e relações proibidas ou permitidas na premissa maior. Isto também quebra a afirmação de que subsunção e aplicação sejam mero silogismo mecânico.
Cóssio tem uma formulação que defende que este processo de aplicação não é simplesmente uma dedução, quer dizer, não é simplesmente levar um fato a uma norma, pois a norma também vai ao encontro do fato (não somente o fato vai à norma procurando subsumir-se dentro da descrição que a norma tem, senão também que a norma vai ao fato). Só que ele diz que nesse processo em que a norma vai ao fato, acontece uma estimativa, que nada mais é que uma questão valorativa. Assim, a norma também vai ao fato porque valora este.
Nessa mesma linha que aqui é defendida, Torré também é da opinião de que a aplicação do Direito é algo mais que uma mera dedução silogística. Não há dúvida de que intervêm valorações impossíveis de serem negadas, pois, como já se tem explicado, toda norma jurídica implica uma valoração de condutas. Um jurista, no momento de aplicá-la a um caso concreto, valora, por sua vez, a norma e também a conduta, isto é, o fato.
Ross entende que o pensamento do juiz não somente refere-se a usar a lei por subsunção dedutiva, senão que também se refere à lei e ao caso por uma dialética estimativa. O caso está submetido à lei por subsunção somente depois que a lei tenha sido declarada apta para o caso a partir de uma valoração.[19] Dessa maneira, situa-se a aplicação do Direito como um processo complexo que não pode ser reduzido a um simples silogismo.
Por tais razões, é possível entender o processo de interpretação a partir de um chamado Círculo Hermenêutico, no qual há todo um processo axiológico que demonstra a complexidade da aplicação do Direito. Se este fenômeno dependesse de um mero silogismo, então não seria necessário um juiz humano; bastaria uma máquina capaz de subsumir fatos a premissas normativas. É verdade que a aplicação é sim silogismo; mas não só isso. Em todo ato decisório intervém valores, idéias. É por causa desta razão que não se pode considerar a aplicação do Direito como um processo silogístico, simplesmente. É um processo dialético (dialética estimativa), cuja principal característica é a interferência de juízos de valor. Quer isso dizer que o contexto não é só normativo; é também valorativo, social, político, finalístico etc.
Todas as instituições do Estado participam do processo de aplicação do Direito. Claro que esse processo da aplicação transcende quando a decisão é uma decisão vinculante. Essas instituições não se reduzem a aplicar normas jurídicas. Deve-se falar, seguindo Dworkin, em aplicação do Direito, e não aplicação das normas, porque no processo de aplicação, o órgão aplicador não lança mão unicamente de uma norma, já que utiliza todo o Direito. O aplicador procurar soluções em diversos outros enunciados, inclusive os que são não normativos, e não apenas na premissa maior.
Nesse sentido, questiona-se qual a relação existente entre o legislador, juiz e o agente da Administração pública quanto à realizando atividade de aplicação? Esses aplicadores são órgãos que fazem parte de poderes independentes. Dessa maneira, qual a relação entre eles no momento da aplicação? Todos são aplicadores do mesmo sistema normativo, do mesmo Direito positivo.
Um ordenamento jurídico funciona com determinados princípios e regras e critérios, e um deles é o critério de ordenação, que supõe competência legislativa. Outro desses critérios é a hierarquização entre as normas, então, no momento da aplicação, também valem esses critérios já que aplicação supõe produção de normas, produção que tem que se ajustar a esses critérios. Não pode o juiz, com seu poder de órgão aplicador, chegar a uma decisão contrária àquela que diz a Constituição. A solução do juiz não pode contradizer normas hierarquicamente superiores. Daí a relação entre os órgãos aplicadores. Essa relação é derivada da hierarquia que existe no sistema jurídico, pela qual quem tem uma competência maior cria normas de maior grau hierárquico. O Poder Judiciário não é subordinado ao Poder Legislativo; são poderes relacionados, porém independentes. Só que esses poderes emitem normas que adentram ao sistema de maneira hierarquizada. As normas jurídicas particulares que o Judiciário produz são hierarquicamente inferiores às normas produzidas pelo Legislativo, portanto, não pode contradizê-las.

n       PRINCÍPIOS REITORES DA  APLICAÇÃO DO DIREITO
(ANGEL RAFAEL)
-         Os juízes não podem deixar de julgar sob pretexto de silêncio, falta de claridade e insuficiência da lei.
-         Os juizes devem obediência à lei.
-         Os juízes devem justificar suas decisões.
-         Os juízes não atuam por iniciativa própria.
-         Os juízes devem interrogar a lei respeitando sua linguagem.
-         Os juízes são moralmente responsáveis pelas suas decisões.
-         Não há jurisdição se não  em virtude de lei.
-         As decisões judiciais são irrevocáveis.
-         A justiça deve ser pública.
-         A todos deve ser garantida a acessibilidade à justiça.
-         A todos deve ser garantido o devido processo legal.
-         A aplicação da  lei deve responder a critérios éticos e  teleológicos.
-         A aplicação da lei deve atender aos seus fins sociais.

 Qual o significado de identificar as instituições e os órgãos aplicadores do Direito? Essa solução, que é resultado do processo, tem natureza vinculante, isto é, a solução obriga, vincula. Eis a diferença entre o sujeito que realiza o Direito e o juiz: este emite uma norma, aquele não. Essa norma que o juiz emite como solução é vinculante. Assim, a solução do Judiciário é vinculante, e essa singularidade só cabe às instituições e órgãos que formam parte do Estado.
3.      ARGUMENTAÇÃO.

Sendo que toda aplicação supõe uma tomada de decisão, é necessário que o aplicador justifique essa sua decisão. É necessário colocar o que é um importante princípio do Estado de Direito – relacionado com a segurança jurídica, a legalidade –, pelo qual toda decisão judicial tem que ser fundada no Direito. Não podemos entender esta exigência em sentido estreito, que é colocar o artigo da norma que corresponde, não é isso não. Essa exigência significa cobrança da necessidade da justificativa da decisão. Não se trata de explicar a decisão; a explicação fica nos marcos limitados do silogismo dedutivo (premissa maior + premissa menor = solução ou decisão).
Seguindo a Torré e a Carrió, a decisão também compreende a utilização de argumentos dedutivos e de argumentos estimativos, ou seja, junto com a subsunção, também a questão estimativa. E aí, indiretamente, fala-se em justiça e eqüidade, o que vai além do simples silogismo dedutivo.
Se toda decisão judicial tem que ser fundada em Direito, devemos interpretar isso como uma necessidade de justificar a decisão. Justificar significa expor os diferentes elementos que foram usados para chegar à decisão. Às vezes isso pode supor criar premissas e não unicamente interpretar as premissas. Não é uma questão de interpretar o fato e interpretar a norma, senão que pode, nesse sentido estimativo, chegar também à reformulação e até à criação de determinadas premissas. Porque o correto não é ir da solução às premissas (como acontece costumeiramente). Quando o aplicador utiliza esse caminho da solução às premissas, ele não tem que justificar. Mas quando ele faz o caminho certo, qual seja, das premissas à solução, ele deve sim justificar o porquê dessas premissas. Ele tem que justificar qual o tipo de valoração, de raciocínio que o levou a essa solução. Esse processo é o processo de argumentação, ou seja, a justificação de certa decisão. Argumentos são os instrumentos, os meios utilizados para convencer; não são simplesmente para expor o ocorrido, é para convencer.[20]
Qual a sentença justa? É aquela que demonstra na sua justificação que essa solução foi a melhor solução. Não é nem dizer que foi a solução correta e, sim, que foi a melhor solução. Se aquele que ler a sentença não concorda com raciocínio, dificilmente a considerará uma solução justa, pois para esta estimativa (considerar justa) é necessário ir aos argumentos e eles devem estar na solução. Não pode ser uma sentença que simplesmente se dedique a explicar a decisão e, sim que se dedique a justificar (expor uma análise que foi feita em relação às premissas). E que o raciocínio utilizado, ou seja, o processo para chegar à solução, seja exposto de maneira que se concorde com o procedimento utilizado para chegar à solução.[21]
Argumentação não é somente uma atividade dos juízes; os legisladores e os doutrinadores também precisam argumentar. Atienza determina os campos em que se verifica a necessidade de argumentação:
1.    Produção: é o momento de criação das normas em âmbito legislativo. A argumentação apresenta-se como necessária para justificar dois discursos decorrentes desse momento: o político e o técnico-jurídico. Nesse sentido, a argumentação apresenta a justificativa, as razões pelas quais aquela lei foi criada e porque tem aquele enfoque. Quando um legislador coloca razões em favor da formulação de um artigo ou de outro, está argumentando, querendo convencer. Se se considera o Direito como uma atividade comunicativa, que o Direito é comunicação, será preciso aceitar que nesse processo comunicativo o emissor tem uma pretensão de que o destinatário chegue não somente a entender, senão que também aceite, e como ele precisa que o sujeito normativo, o destinatário, aceite a sua decisão, que é a intenção normativa, a intenção da norma, ele precisa argumentar;
2.   Explicação: é o campo da dogmática. Defendem-se teses, critérios ou pontos de vista, apresentando razões. Um professor também pretende convencer os alunos de que o que ele está defendendo, está certo. Outros autores também necessitam de argumentos para convencer aos leitores de suas posições, convencer de que o raciocínio é correto, que as razões colocadas estão corretas[22];
3.    Aplicação: é o principal momento da argumentação. A necessidade argumentativa afasta da aplicação do Direito o mero silogismo, o formalismo. O poder não isenta de justificar a decisão. Aí está a razão pela qual não se pode ver mais a aplicação do Direito como um processo de correlação de premissas, mas de demonstração e justificação de uma escolha; não é mais para dizer como chegou à aquela decisão, mas sim porque aquela é a melhor decisão (ou seja, porque aquela é a decisão mais justa).  [23] 
Se toda aplicação é um processo decisório, será preciso compreender que, necessariamente, essa decisão, quando se trate do Direito (ou seja, quando se trata de uma mensagem determinada que é enviada a determinado sujeito normativo), deve vir acompanhada das razões que a motivaram. Pode-se dizer, com isso, que a motivação e a justificação da decisão têm o mesmo significado. Toda decisão tem que ser justificada, especialmente esse tipo de decisão jurídica em que se pretende dirigir as condutas das pessoas, estabelecendo orientações para os destinatários normativos e, portanto, o Direito, como sistema normativo, está interessado em que aconteça uma aceitação das decisões, uma aceitação das prescrições. Para tanto, é necessário convencer. Não é imprescindível. Só que o Direito não pode ser realizado o tempo todo de maneira violenta, com força. É necessário que a mensagem tenha uma determinada aceitação para que a conduta querida, esperada, seja garantida.
              São três as razões que obrigam a argumentar no Direito:
1.    Problemas de linguagem: a linguagem jurídica é caracterizada por uma textura aberta, pela emotividade etc., o que leva a uma necessidade de determinar o sentido do enunciado, demonstrando porque aquela interpretação apresenta-se como a melhor;
2.    Aceitabilidade da decisão: a decisão deve ser aceita não apenas pelas partes, mas também pelo restante da comunidade. Para tanto, é necessário que todas as pessoas (racionais) compreendam e entendam a decisão como um discurso racional e como resultado de um capricho ou de uma arbitrariedade;
3.    Evitar a arbitrariedade: porque ao expor as razões o aplicador deverá estar munido de certa racionalidade, ou seja, seu discurso deverá ser aceito pelos membros da comunidade.  

OS FINS DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
- Aceitabilidade
- Razoabilidade
- Racionalidade
- Generalidade
- Objetividade
- Comunicabilidade
- Prescritiva
- Persuasiva ou de convencimento

OS ÂMBITOS DE VALIDADE DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
a)      Espacial: A determinação das partes: jurisdicional ou órgão público e litigantes (orador -auditório)
b)      Formal: As normas (secundárias de Hart) e em sentido geral as processuais do sistema jurídico.
c)      Material: As normas (primárias de Hart) e em sentido geral as materiais  do sistema jurídico.
d)     Temporal: A argumentação (como discurso racional) vale (tem validade) no momento em que acontece o confronto de argumentos e sua validade atemporal precisa ser argumentada.

FASES DO PROCESSO DE ARGUMENTAÇÃO
1.      Verificação das premissas: qual é o direito aplicável e que caracteriza o fato) Determinação com relação a se os fatos (premissa menor) podem ser subsumidos no enunciado do direito (premissa maior) e a qual dele.
2.      Processo hermenêutico ou de identificação de significados atribuíveis às premissas. Os juízos de valor estão presentes no processo. A dialética estimativa acontece aqui e o processo probatório também. Pode vir acontecer uma construção das premissas (normativas), se as premissas existentes não são consideradas suficientes, são inexistentes ou materialmente insatisfatórias. 
3.      Inferência normativa: derivação da conseqüência jurídica a utilizar [não conseqüência lógica]  e justificação da escolha.
4.      Conclusão (determinação- decisão- nova norma) parte prescritiva e/ou descritiva. A passagem das premissas à conclusão não tem caráter necessário e o silogismo acontecido como processo dedutivo não foi necessariamente formal, mas bem material.

REGRAS PARA O PROCESSO DE ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
- Nenhum orador pode se contradizer.
- Todo orador deve demonstrar com argumentos e razões aquilo que afirma ou justificar porque não fazê-lo.
- Todo orador deve defender (racionalmente) as teses em que acredita.
- Todo orador cuidará que suas afirmações sejam válidas para todas situações semelhantes.
- Diferentes oradores podem usar a mesma situação ou premissa (normativa ou fática) com diferentes significados.
- As conclusões devem ser inferidas das premissas, sem que exista uma relação de caráter necessário entre elas.
- Nenhum orador pose ser impedido de expor seus argumentos e defendê-los.
- Quem apresentou um argumento deve ser obrigado a apresentar outro (s) se surgirem argumentos em contrário.
- Quem rechaça um argumento tem que expor razões para isso.
- O silogismo não pode ser reduzido ao formal, pois se lhe reconhece uma dimensão material.

OS LIMITES DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
- O significado literal dos textos.
- A realidade existente.
- Exigências formais e materiais do discurso racional.

TESE FINAL 1
A argumentação jurídica está associada sempre a um processo decisório que leva implícito uma proporcionalidade, equação e ponderação entre normas (sejam regras ou princípios), significados (resultado de interpretação) e argumentos (dedutivos e não dedutivos)

TESE FINAL  2
Argumentar num sistema aberto é solução encontrada para explicar e utilizar o Direito, deixando atrás os formalismos e na procura de uma utilidade prática à ciência jurídica (especialmente à dogmática). Essa perspectiva faz coincidir a teoria da argumentação e a hermenêutica e é a manifestação mais evidente da superação da velha dicotomia Direito Natural X Direito positivo, que tem permitido falar da “Terceira via”. Se uma característica identifica o pós-positivismo é que o tema Argumentação colocou-se no centro da discussão















4.   O DESENVOLVIMENTO  JUDICIAL DO DIREITO

n       FORMAS DE DESENVOLVIMENTO JUDICIAL DO DIREITO
-         Quando se realiza a integração do direito por existirem lacunas:
-              a) desenvolvimento imanente à lei
-              b) desenvolvimento superador da lei
-         Quando não existe interpretação anterior.
-         Quando se desconsidera uma interpretação anterior.
-         Quando se utiliza uma interpretação extensiva.
-         Quando se utiliza uma interpretação restritiva.


OS LIMITES DO DESENVOLVIMENTO JUDICIAL DO DIREITO

As competências conferidas a outros Poderes.
Os princípios diretivos do sistema jurídico.
O sentido literal possível do enunciado de direito.
A consciência jurídica da comunidade.
Stare decisis (interpretação vinculante anterior de órgão superior).
A competência conferida a cada instância judicial.
A racionalidade e a razoabilidade das decisões.
















4. Conclusão.
CADA ALUNO FARÁ ELABORARÁ E ENVIARÁ SUAS CONCLUSÕES AO PROFESSOR.



































5. Referências bibliográficas.
ALEXY
ATIENZA
CARRIÓ
CÓSSIO
DWORKIN
FERRAZ JUNIOR
KELSEN
LARENZ
PECES-BARBA …
PERELMAN
ROSS



































[1] Não há como tratar os temas da interpretação e da aplicação sem relacioná-los ao tema Direito e linguagem.
[2] Até Napoleão considerou negativo o fato de seu Código Civil ser interpretado, chegando a dizer "Meu código está perdido!".
[3] Nino ensina que a interpretação ocorre apenas quanto às normas jurídicas. Mas, na verdade, esse pensamento deve ser afastado, porque não há apenas interpretação das normas jurídicas, pois o correto é falar em interpretação do Direito, porque o Direito não é somente um conjunto de normas jurídicas.
[4] É incorreto dizer que o intérprete faz uma escolha entre diferentes normas; ele faz uma escolha entre diferentes significados. Para chegar à escolha ele necessitou identificar diferentes significados. É um momento diferente da argumentação. A argumentação é o momento da justificativa da escolha. Toda decisão judicial deve ser fundada em Direito. Mas, a escolha é diferente da justificativa, que é a “explicação” da escolha. Um dos motivos pelos quais a escolha deve ser justificada é porque o Direito visa à justiça e, por isso, deve expor o fundamento da escolha, quer dizer, justificar que o significado escolhido foi o correto. Para tanto, o juiz estuda o fato, procurando qual a previsão normativa com relação a esse fato, quantas formulações existem ou incidem nesse fato e daí quais os significados dessas diferentes normas que incidem e, finalmente, escolhe uma norma. Posteriormente à escolha da norma, escolhe um significado dentre os diferentes significados que essa norma tem. É quando, então, justifica sua opção, justifica a decisão, de maneira que esta nada mais é do que a expressão da escolha. O momento interpretativo é exatamente essa escolha. Finalizada a interpretação, vem a aplicação, que é a decisão. Veja, então, que interpretação (escolha) é um momento prévio e distinto da aplicação (decisão). Interpretar, então, acaba sendo um processo decisório que remete o intérprete à escolha entre diversas normas possíveis de serem aplicadas àquele determinado caso. Dessa maneira, o intérprete escolhe as possíveis normas que incidem no caso concreto e decide dentre elas quais as que apresentam um significado mais aproximado do caso.  
[5] Há, ainda, um terceiro momento é o momento da argumentação da decisão, que é uma maneira também de justificar a escolha.
[6] Outros autores, como Kelsen, apresentam outro tipo de subdivisão quanto ao intérprete. Assim, a interpretação pode ser vinculante ou não-vinculante. Há interpretações que são vinculantes. A interpretação que um doutrinador faz não é vinculante, por isso não é fonte do Direito. 
[7] Agora, como todos eles têm que estar presentes no momento da interpretação, eles não podem ser considerados uns contra os outros, senão um complementando o outro.  Ou seja, aquela questão de escolher ou interpretação subjetiva ou interpretação objetiva, não existe mais.
[8] O critério construtivista de interpretar o Direito representa um processo dialético que reúne, ao mesmo tempo, muitos métodos e que é uma conseqüência da pragmática judicial americana. A questão não está em ficar preso em uma norma, não é ficar preso na intenção do legislador, senão em fazer uma interpretação progressiva através da qual o intérprete acaba construindo um significado. Não está fixo nem na norma e nem no legislador, senão que a busca do significado acompanha as mutações, as demandas do processo social. Isso tem muito a ver com o Direito alternativo, com a solução procurada a partir do Direito, chegando a uma conclusão diferente da que está no Direito.
[9] Existe uma corrente do pensamento jusfilosófico – o jusrealismo – para a qual o momento mais significativo do Direito é o momento da aplicação. Tanto é assim que eles não dão suficiente relevância às normas, que servem como “objetos de decoração” do pensamento dos juízes. O que importa é o momento da aplicação onde o Direito é verdadeiramente criado. Para eles a produção também se dá na aplicação. Todavia, para os educados no sistema romano-germânico, a produção ocupa o espaço importante.
[10] A aplicação do Direito, todavia, não ocorre apenas na via judicial, ou seja, na solução de litígios. Kelsen demonstrou que o processo de criação e produção (legislativo) também é um processo de aplicação: aplicam-se normas gerais (que são as normas constitucionais que regulamentam o processo legislativo) a um caso particular. Quer dizer que o processo de produção legislativa não é outra coisa que o processo de aplicação das normas constitucionais. O órgão legislativo aplica as normas gerais contidas na Constituição.
[11] Tome como exemplo do que foi dito pelo autor as situações em que o mesmo caso, a mesma norma, mas entre elas existe um telefonema, um fato novo, compreensões diferentes, um valoriza o sujeito, o réu pode ser primário etc.
[12] Nem sempre é o juiz quem aplica o Direito. Além do juiz, o Poder Executivo também aplica Direito. Entendida a aplicação como subsunção de uma norma geral a um caso concreto, um policial, por exemplo, aplica o Direito quando aplica uma multa de trânsito.
[13] Qual a diferença entre uma aplicação que pode ser feita por um agente autorizado e uma aplicação que pode ser feita por alguém não autorizado? Quando se fala em aplicação, fala-se naquela realizada pelo Estado, que é um tipo especial de realização do Direito, porque intervém nela o Estado. Se é verdade que toda aplicação supõe uma realização, é preciso dizer que quando essa aplicação é executada pelo Estado, através de seus agentes, está-se perante um tipo de realização especial, porque o sujeito realizador, que dirige o processo de realização, é o mesmo sujeito que criou a norma que vai ser aplicada (o Estado). A intervenção do Estado garantindo o cumprimento daquilo que ele estabeleceu, assegurando que seja cumprido o que ele criou, procurando a eficácia social das normas.
[14] É o que mais interessa aqui. Porque nós todos também somos aplicadores do Direito, participamos da aplicação do Direito, seja nas normas de competência, seja nas normas de condutas, quando obedecemos à norma, aplica a norma, significa atingir o objetivo ou o critério teleológico da norma, que significa a realização da norma.
[15] Aplicação sempre supõe a criação de uma norma. Aplica-se Direito, criando Direito. Quando os aplicadores são instituições ou órgãos do Estado, eles aplicam Direito criando Direito. É a diferença entre aquele que é aplicador do Direito e simplesmente aquele que observa, segundo o que é proibido, ou obrigado ou permitido fazer. A atitude de abstenção ou cumprimento, de acordo com o que está estabelecido, não produz novas normas. Claro que quando dois particulares realizam um contrato produzem normas, mas esse contrato só é possível porque uma norma superior o autorizou, ou seja, o contrato nada mais é do que uma maneira de realizar também aquela norma.
[16] Nem sempre a aplicação supõe uma produção, como, por exemplo, o que ocorre com os órgãos legislativos: o Congresso Nacional também é um aplicador de normas porque para produzir lei ele aplica normas constitucionais que o autorizam a criar. Qual o resultado da atividade de aplicação do Direito que ele realiza? É outra norma. O resultado é uma lei, ou uma resolução, mas supõe normas.
[17] A discussão aqui está em que tantos outros, como Vernengo e Ross, defendem que sempre a norma produzida é inferior à norma que foi aplicada. Mas quanto para afirmar isso é preciso ter cautela, já que nem sempre a norma resultado é hierarquicamente inferior à norma aplicada. A não ser quando feita pelo poder constituinte derivado, quando cria emendas constitucionais que têm o mesmo valor que as normas constitucionais, não existindo diferença hierárquica. Neste caso não vale a regra de que a norma resultante tem uma atividade de aplicação sempre hierarquicamente inferior à norma aplicada. Quando é aplicado por outro órgão ou instituição, a regra vale. A sentença é sempre uma norma jurídica, só que uma norma jurídica particular e é sempre hierarquicamente inferior à norma que foi aplicada, no caso, geral e abstrata.
[18] Ou, dito de outra maneira, a premissa menor é subsumida na premissa maior resultando uma conclusão que é uma nova norma. Essa premissa maior permite que esse fato seja nela subsumido.
[19] Mais uma vez demonstra-se que não é somente um silogismo dedutivo, porque na aplicação do Direito a premissa menor, logicamente, tem que ser encaixada na premissa maior, só que esse encaixe supõe que o aplicador faça uma valoração do fato. É um duplo sentido. Do fato à norma e da norma ao fato, repetidamente, até chegar à conclusão de que essa norma corresponde àquele fato e, conseqüentemente, que essa prescrição deve ser aplicada ao sujeito que interfere no fato.
[20] A argumentação já constava nas pautas de discussão dos sofistas e de Aristóteles. Talvez a argumentação apresentou um desenvolvimento, no Direito, mais como método do que técnica. Roma a desenvolveu como técnica: discurso justificativo da interpretação do Direito posto (aquilo que hoje é chamado de dogmática). Com o positivismo jurídico, a lógica formal toma conta de todo o discurso jurídico. A argumentação era utilizada como método de explicação do Direito. Como reação surgem defensores de uma lógica informal, que denunciaram os prejuízos da lógica formal para a construção do Direito. Para isto, foi necessário introduzir no contexto jurídico as idéias de valor e de juízos de valor, o que inaugurou a nova era do discurso argumentativo. A argumentação passa, então, a ser pensada como técnica discute como o Direito deve ser interpretado e aplicado (instrumento para justificar, interpretar e aplicar o Direito). Isto marca o início do pós-positivismo, que defende um pensamento jurídico a partir de valores.
[21] Explicação é simplesmente expor. Justificar é argumentar, é defender, é convencer do porquê, é uma explicação que procura a aceitação da solução, porque com a aceitação da solução, virá a legitimidade. Judicialmente, nas sentenças, quando o juiz fala do fato e da norma, está explicando o caso. Mas o argumento, a justificativa supõe entrar na análise da premissa fato e da premissa norma convencendo de que aquela decisão é a melhor.
[22] Argumentação não se confunde com a Retórica. Esta é a apresentação de razões com o objetivo de persuadir; tenta convencer sem, no entanto, seguir regras. A argumentação é diferente: é um debate a partir de regras pré-estabelecidas, comensuradas, aceitas, medidas. Existe um procedimento com racionalidade (discurso racional). A racionalidade está no procedimento, e não necessariamente no conteúdo da tese. Na argumentação jurídica parte-se do Direito, onde se encontram regras que tornam o procedimento racional.

[23] Para todo o texto relativo à   aregumentação utilizaram-se os livros de ALEXY, ATIENZA E PERELMAN, o segundo em especial.